O professor é uma das inúmeras fontes de conhecimento dos alunos.
Seu papel precisa ser repensado

Conceito

Pode até parecer redundante, mas é sempre bom reforçar que o professor é peça-chave para impulsionar qualquer tipo de mudança em busca de uma educação de qualidade. Grandes transformações e inovações no ensino são frutos da paixão desse profissional pelo processo de aprendizagem.

Durante décadas, o professor tinha a função de passar conhecimentos para o estudante. Por causa do acesso à informação ser bem restrito, era preciso consultar especialistas ou ir à biblioteca para pesquisar nos livros a maioria dos temas, o que, além de pouco prático, demandava tempo do jovem que estava ingressando no mercado de trabalho.

O estudante apto a se tornar um bom trabalhador era aquele com uma ampla bagagem de conhecimento sobre uma determinada área. Alguém que não precisasse “gastar” tempo buscando novos aprendizados, tendo guardado o máximo de conteúdo possível durante sua formação, concentrando-se apenas em produzir.

Como na economia funcionava assim, eram consideradas as melhores escolas aquelas que depositavam a maior quantidade de conhecimento na cabeça dos alunos. Consequentemente, os melhores professores eram aqueles capazes de fazer isso acontecer.

No século XXI, essa dinâmica mudou. O professor é uma das muitas fontes de conhecimento dos estudantes e, assim, seu papel precisa ser repensado. Todo o conhecimento da humanidade, todos os fatos, notícias e descobertas são acessíveis, instantaneamente, para qualquer pessoa que souber utilizar minimamente a internet.

Ter muito conhecimento não é mais a grande vantagem para os jovens que estão de olho no mercado de trabalho, porque qualquer fato que ele não saiba pode ser pesquisado, com alguns clicks ou em uma conversa com um especialista, por meio de um chat, mesmo a distância.

Além disso, o atual conceito da educação é muito mais amplo. Não queremos só formar trabalhadores, queremos pensar no jovem como cidadão, com um pensamento crítico, analítico e solidário, capaz de transformar a si mesmo, sua realidade e a de seu entorno.

Nesse sentido, o verdadeiro “pulo do gato” do professor é “mergulhar” na cabeça do estudante. Isso pode acontecer de diversas formas, como vamos mostrar nas próximas páginas.

Nós estamos em transformação. É absurdo pensar que nós é que estamos prontos e os estudantes não. É a negação da vida. Nós nunca estamos e nunca estaremos prontos. Se o objetivo da escola não for a transformação, que sentido tem a escola?

Desafios

O novo papel do professor traz desafios novos também:

Caminhos percorridos

Os papéis assumidos pelo professor estão sendo constantemente ressignificados e reconstruídos. Ao integrar as novidades tecnológicas à sala de aula, ele deixa de ser o “dono do saber” e se transforma num agente da transformação. Algumas escolas, referências em inovação, têm denominações e funções diferentes para o professor:

Lembrete É importante ter em mente que você não precisa se encaixar em uma única denominação, já que todos esses papéis são complementares. Numa mesma classe, você pode trabalhar com diferentes aspectos, de acordo com a necessidade de cada grupo de alunos

No cenário atual da educação, é fato que o professor precisa estar bem preparado para lidar com um jovem, cuja vida é mediada pela tecnologia. Se a formação inicial do educador o levou a um tipo de conteúdo e abordagem diferentes das necessidades da escola e dos alunos de hoje, surge um conflito interno que coloca o professor numa situação desconfortável, deixando-o, muitas vezes, vulnerável.

Por isso, é preciso haver um alinhamento bem estruturado entre a coordenação pedagógica e os professores, em que todos concordem com o caminho a ser trilhado, para não deixar que esse tipo de ruído atrapalhe o processo de transformação. Nesse sentido, o educador que está sempre em busca de uma formação contínua, bem como o desenvolvimento de suas competências, tende a ampliar o seu campo de trabalho.

Para os adultos, é muito mais difícil aprender. Eles têm as aprendizagens anteriores muito mais sedimentadas. Para encarar o desafio de uma escola inovadora, você tem que estar disposto.

Formar é tentar colocar numa forma, então não gosto dessa palavra. A palavra é transformar.

Ideia! Além de contar com sua equipe, pesquise também outras opções de formação continuada que estejam ao seu alcance e incentive outros professores a fazerem o mesmo. Você pode dar o pontapé inicial, conferindo os cursos gratuitos e on-line da Fundação Telefônica, no portal Escolas Conectadas. Outra opção é a Escola Digital, uma plataforma inteiramente gratuita que possui ampla possibilidade de customização.

Na Northern Beaches Christian School, localizada na Austrália, existe um hábito que é incessantemente disseminado por toda a escola: com certa frequência, todos os funcionários participam de cursos de aprendizagem profissional que são facilitados, preferencialmente, por outros funcionários. Professores que estão interessados em uma nova prática profissional são apoiados pela equipe a pesquisar, testar e desenvolver o método para si e, em seguida, incentivar os demais a fazerem o mesmo.

O governo federal tem também uma série de iniciativas de formação continuada na área de educação, principalmente para professores do ensino fundamental e do ensino médio. Conheça as principais:

Passo a passo

Você não vai mais atuar sozinho e precisa buscar a integração das disciplinas dos estudantes, dos contextos e do aprendizado. Para isso, trabalhe com todos os agentes da escola e fora dela. Estudantes, familiares e colegas profissionais serão seus parceiros de cocriação, conectados a questões contemporâneas, permeáveis aos recursos da comunidade e do mundo.

Como o seu trabalho depende dos demais atores do processo de aprendizagem, é essencial que você crie mecanismos para engajar todos.

Para ter consciência dos diferentes estilos de aprendizagem presentes em uma única sala de aula, valorizando o grupo e respeitando o ritmo de cada estudante, analise quem é a sua turma. Em cada momento, procure entrar em contato com essas diferenças tão ricas.

Para definir temas e objetivos de cada momento, revisite o projeto da escola, mantendo-os integrados, e procure alinhá-los ao trabalho dos outros professores.

Faça uso do planejamento colaborativo das atividades para chegar a três definições: qual será o produto final, quais estratégias vai utilizar na mediação pedagógica e quais os processos de avaliação irá adotar.

Como o estudante, o professor também se coloca no papel de quem aprende. Por isso, é interessante que trate de suas dificuldades, curiosidades e vontade de crescer, buscando outras fontes de aprendizagem que acredite ser importantes e válidas para sua demanda. Cursos presenciais ou a distância são bem-vindos, além de processos de tutoria e treinamento.

Quando o professor se depara com possíveis deficiências de sua formação, certa insegurança começa a fazer parte do seu dia a dia. Nesse caso, procure o apoio do coordenador pedagógico de sua escola, que poderá orientá-lo de uma forma mais local e contextualizada, apoiando-o na criação de projetos, portfólio dos estudantes e criação de diários de acompanhamento. Talvez você ainda se sinta meio inseguro em determinados momentos, mesmo com esse apoio, mas com a busca por uma prática mais focada no objetivo final da educação, com certeza você irá ajudar os estudantes a aprenderem.

Eu tenho medo todo dia (risos). A insegurança é bacana também. Quando ficamos seguros demais, ficamos muito arrogantes.

Por muito tempo, questões hierárquicas colocaram o professor num patamar muito distante dos alunos, restringindo sua relação ao período que passavam em sala de aula. As coisas mudaram e, hoje, esse olhar também se transformou consideravelmente. Agora, a escola incentiva o professor a estar cada vez mais próximo dos estudantes. Refletir sobre esse novo papel e as formas de criar essa aproximação faz parte de seu trabalho.

Cada vez que um determinado professor entrava na sala de aula antes, ele tinha um tipo de escola na cabeça dele, uma concepção de sala, uma concepção de aula, uma concepção de estudante e uma concepção de função da escola, então daí nascia uma relação de poder: ‘Eu é quem mando aqui’. Não era uma posição horizontal, era hierárquica.

Aqui existe uma quebra de paradigmas. O estudante aqui acha normal a gente pedir a ajuda deles. Eu costumo pedir ajuda para os estudantes maiores direto.

Uma das ferramentas mais poderosas do professor é o diálogo aberto e objetivo, não só com os alunos, mas com todos os profissionais da escola. Estar disposto a ouvir esses jovens e seus pares, ficar atento aos sinais que eles emitem e conseguir extrair o melhor dessas interações são fatores importantes para que você possa refletir sobre a sua prática profissional e como andam as suas concepções sobre tudo que envolve a escola.

Ideia! Faça uma autoanálise sobre sua prática diária, criando uma lista de tudo o que você gostaria de melhorar e também do que você faz muito bem. Busque o apoio de seus colegas, organizando equipes e grupos de discussão, em que um pode ajudar o outro assistindo a suas aulas, fazendo críticas e aprendendo juntos.

O professor é tradicionalmente o lugar do saber, o lugar do poder, muitos lugares que ele tem na prática dele, mas todos ligados ao poder. Quando você coloca ele trabalhando horizontalmente, é muito difícil de início, porque ele fica muito exposto. Exposto pelos estudantes, pelos pais, exposto pela comunidade.
O professor exigia o respeito, se o estudante falava alguma coisa era: ‘Não, agora EU estou falando’. Nem se permitia que o estudante tivesse muita opinião, porque o professor estava muito focado no que queria dizer, no que queria cobrar, ou queria passar. Hoje eu me sinto fora desse pedestal, mais próxima deles. Mudou minha visão completamente.

Um exemplo de horizontalização do trabalho do professor, aproximando-o do estudante, acontece nas Escuelas Experimentales, uma rede de escolas públicas democráticas na Argentina em que a metodologia de ensino do currículo nacional é aplicada usando as artes. As aulas acontecem em rodas de discussão de, no máximo, 15 alunos.

O professor pode, por exemplo, tratar o contexto histórico de um artista ou de seu quadro em uma aula de pintura. Música, poesia e dança são utilizadas pelos educadores para abordar as tradições locais. Os professores acompanham o desenvolvimento do aprendizado de seus alunos, além de especificidades como visão, audição e alimentação. Não existem provas. As avaliações ocorrem por meio das produções elaboradas nas próprias aulas.

Ao final do dia, os professores se reúnem por duas horas para falar sobre o trabalho desenvolvido e fazer o planejamento do dia seguinte. As decisões são tomadas levando em consideração a opinião de todos. Imagem de Alunos

Eu simplesmente falava, passava a matéria no quadro, explicava e pronto: ‘Entenderam?’. E acabou ali. Hoje eu estou preocupada em sentar com o estudante e falar de forma que ele entenda, quero mergulhar na cabeça dele.

Passo a passo

Uma boa forma de se aproximar dos alunos e, ao mesmo tempo, refletir sobre sua prática profissional, pode acontecer com uma simples inversão de papéis. Saber como eles enxergam o seu trabalho pode ser um grande incentivo para fazer uma sintonia fina em suas técnicas de ensino.

Peça aos estudantes que o desafiem. O ideal é que eles organizem um tipo de gincana em que podem testar seus conhecimentos gerais sobre a escola e a comunidade, e também o conteúdo pedagógico.

Para tornar a atividade mais competitiva, separe-os em dois ou três grupos e sugira que escolham um líder para cada um. Esse é um ótimo momento para estimular o engajamento e a noção de responsabilidade.

Uma orientação importante é que, além das perguntas, eles também devem redigir as possíveis respostas, para que você possa ter uma noção de como cada grupo realizou suas respectivas pesquisas para a elaboração das questões e qual o nível de organização de cada um.

Incentive-os a ousar nas perguntas e questionamentos, sem receio de serem repreendidos. O importante é que eles tenham a chance de perceber que também podem ensinar!

Nessa gincana, o objetivo é estimular a interação entre os alunos e o professor, então todos ganham. Os alunos aprendem de uma forma mais descontraída e divertida, enquanto você ganha insumos para refletir sobre o trabalho que desempenha com esses jovens.

O professor tem um importante papel na integração entre a escola e as famílias dos estudantes, uma vez que ele contribui para que os jovens tenham uma perspectiva mais positiva na construção de uma vida melhor, de cidadãos produtivos e autônomos.

Realizar reuniões periódicas, para que as famílias estejam constantemente informadas sobre os progressos e anseios dos alunos, pode ser o primeiro passo para os responsáveis se sentirem mais à vontade e, consequentemente, participar ativamente do cotidiano escolar.

Ideia! Essa aproximação, certamente, deve acontecer de forma gradual e espontânea. Por isso, não desanime se não houver o retorno esperado nas primeiras convocações. Você precisa ter em mente que, para muitos pais, pode ser difícil comparecer a reuniões com a frequência necessária. Então, tente criar grupos do WhatsApp ou até mesmo de e-mails, para deixá-los atualizados de todas as novidades.

Exemplos de quem já faz

Na Escola da Ponte, em Portugal, os contatos com as famílias dos estudantes são feitos pelo professor tutor, que acompanha, orienta e avalia diariamente as atividades realizadas pelos jovens. Funciona assim: a escola oferece atividades de fortalecimento do currículo àqueles que necessitem que os seus filhos tenham um acompanhamento, e fica a cargo desse professor traçar o melhor caminho para solucionar as dificuldades desses alunos. A organização da Escola da Ponte inspira uma filosofia inclusiva e cooperativa que, simplificando bastante, pode ser resumida assim: “todos precisamos aprender e todos podemos aprender uns com os outros. E quem aprende, aprende a seu modo no exercício da cidadania.”