O estudante deve ter espaço e apoio para dedicar-se
aos seus interesses e objetivos de vida

Conceito

Trabalhar com “projetos de vida” dentro da escola é um complemento importante à personalização do ensino. Uma vez que você já sabe quem são os seus jovens, agora é preciso descobrir aonde eles querem chegar, para ajudá-los e orientá-los nesse caminho.

Mas, atenção! Não se trata apenas de perguntar: o que você quer ser quando crescer?

Todo ser humano pensa sobre sua vida, suas escolhas e seus planos. O estudante, que tem um futuro inteiro pela frente, depois de sair da escola, está com a cabeça fervilhando de ideias e sonhos o tempo todo.

Por exemplo: você se lembra de tudo que se passava na sua cabeça, quando tinha a idade deles?

Agora, imagine essa avalanche de informações, dia pós dia, vindas da família, dos amigos, da escola, da comunidade, junto à gama de conteúdos da internet.

Há uma enorme carga de expectativas e ansiedades sendo depositada no jovem que, provavelmente, não terá como lidar sozinho com tantas cobranças. A transição entre a adolescência e a entrada na fase adulta pode trazer certa insegurança e confusão em relação aos próximos passos e as rotas a serem escolhidos. Muitas dúvidas dos jovens, nesse período, podem ser minimizadas a partir de planos pensados e colocados no papel.

Como já sabemos, os estudantes têm biografias muito distintas e, além de todas as informações que eles consomem diariamente, os rumos que suas vidas vão tomar são cada vez mais variados. Para muitas pessoas, pensar no futuro, fazer planos é algo natural. Organizar-se para sua realização, entretanto, normalmente é um grande desafio.

Enquanto, no passado, a escola buscava uniformidade de resultados para gerar operários capazes de participar da economia industrial, hoje em dia dependemos muito mais da pluralidade para melhorar um novo mercado e a qualidade de vida. No mundo atual, com o amplo crescimento do conhecimento humano, não é mais possível passar por todos os conteúdos importantes à vida escolar de um estudante.

O essencial é que ele aprenda a identificar o que precisa, num determinado momento, e como acessar aquela informação para avançar.

Quando personalizamos o ensino, a escola cria uma cultura de dar a oportunidade para que os estudantes possam se dedicar ao desenvolvimento dos próprios interesses, com o apoio e a orientação do professor, em busca do autoconhecimento e de metas pessoais.

Construir caminhos é construir o aqui e agora, ajudando os jovens a entender sua relação com tudo que os cerca, buscando soluções para as questões que os incomodam, neste momento, e incentivando-os a refletir sobre as consequências de suas opções.

Desafios

Caminhos percorridos

Além das necessidades acadêmicas dos alunos, a escola deve estar focada no desenvolvimento integral de cada jovem, ajudando-o a progredir em diversas dimensões e, sempre que possível, a materializar seus sonhos.

Já deve ter ficado claro, mas é sempre bom enfatizar: dedicar-se ao projeto de vida dos estudantes também significa trabalhar com as competências para viver com sucesso neste século. Autonomia, estabilidade emocional, sociabilidade, capacidade de superar fracassos, curiosidade, perseverança… Estes são apenas alguns exemplos de valores que precisam ser abordados com os jovens.

O Colégio Estadual Chico Anysio, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), possui uma proposta curricular inovadora para o ensino médio, em tempo integral, criada pelo Instituto Ayrton Senna. O objetivo é enfrentar os maiores desafios dessa fase escolar, como a evasão, causada por vários motivos, dentre eles a falta de atratividade da escola e a desconexão entre o currículo escolar, as competências necessárias para o trabalho, o convívio em sociedade e a continuidade dos estudos.

Para isso, a equipe do colégio foi capacitada com um curso de formação focado em metodologias integradoras, recebendo suporte técnico e pedagógico para o desenvolvimento de todos os aspectos necessários para uma educação alinhada com as necessidades da geração do século XXI.

Entre as abordagens inovadoras contempladas na proposta estão: a integração das áreas do conhecimento; o desenvolvimento do protagonismo juvenil e da autonomia do aluno, por meio de projetos interdisciplinares; projetos de vida e momentos de autogestão; equilíbrio entre o trabalho com competências acadêmicas (intelectuais) e as do século XXI; e utilização de tecnologias digitais.

Imagem de Alunos

O projeto de vida está muito ligado à aprendizagem baseada em projetos, uma prática que detalhamos no capítulo “Personalização do ensino”. Ao realizar essas atividades, a escola contribui para mapear os interesses de cada aluno, ajudando-o a delinear seus principais anseios de vida e a encontrar meios para colocá-los em prática.

O professor mentor pode contribuir muito para isso, ao relacionar os objetivos dos projetos escolhidos pelos jovens a temas como: desenvolvimento pessoal, planejamento educacional, orientação para o sucesso acadêmico e planejamento da carreira.

O projeto de vida está muito relacionado à transformação social. O próprio trabalhar com aprendizagem baseada em projetos passa por pensar em projetos para melhora da vida deles, não apenas a construção de uma maquete, por exemplo. Quando conversamos com os professores sobre por que eles queriam mudar, eles falaram de como a escola tinha que ser um lugar onde as crianças são felizes agora. Se temos um projeto de vida, ele está relacionado ao presente e à melhoria da vida dele nesse momento.

Caso você comece a trabalhar o projeto de vida com estudantes mais velhos, a melhor alternativa é dar um foco maior à carreira profissional.

É importante buscar informações fora da escola, realizando feiras de profissões com palestrantes convidados, de diferentes áreas, para conversar com os alunos, esclarecendo dúvidas sobre o mercado de trabalho, desmistificando certos tabus e incentivando-os a pesquisar com mais propriedade as áreas de maior interesse.

O Sistema de Aprendizaje Tutorial traz inovação educacional para áreas rurais da Nicarágua. A metodologia tem grande foco em aprender fazendo, mesclando teoria e prática, com base em quatro pilares: matemática, ciências, linguagem e comunicação e serviço à comunidade, vinculados a práticas agrícolas, de liderança e empreendedorismo.

Os professores atuam como tutores, promovendo a interdisciplinaridade entre o currículo escolar e a realidade do campo. As aulas acontecem em variados locais, de salas de aula a espaços públicos e até mesmo na casa dos alunos.

Existe uma preocupação de que os alunos, além de estudar, realizem estágios, identifiquem oportunidades econômicas em suas comunidades, criem planos de negócio, chegando até a vender sua produção a mercados e compradores.

Muitos focam, por exemplo, no cultivo de plantações sustentáveis ou na criação de animais. Eles organizam feiras com seus produtos e toda a gestão é feita por cooperativas criadas pelos próprios alunos. Além da agricultura, eles também oferecem serviços como limpeza, pequenos consertos e campanhas de saúde. Isso tudo para que o jovem se torne, de fato, um vetor de transformação da comunidade onde mora.

Imagem de Alunos

A escola pode se organizar para que, a cada novo conhecimento adquirido, crie-se um em que os estudantes reflitam sobre como aquele conteúdo pode ajudá-los em suas trajetórias pessoais. Além de dar uma oportunidade para que pensem sobre suas vidas, essas reflexões também motivam a participação mais ativa durante cada aprendizado!

Na School 21, de Londres, Inglaterra, os estudantes usaram o momento em que habitualmente trabalham em projetos para elaborar melhorias à sua vida presente, desenhando uma sala de aula para o novo prédio da escola, de acordo com o que eles entendiam como um bom espaço para estudos.

Primeiramente, precisamos fazer uma reflexão sobre a vida dos estudantes. Para isso, é necessário entender o contexto em que eles se encontram e conversar com outros professores sobre essa preocupação.

Afinal, o jovem não é mais um depósito de conteúdo, mas um ser pulsante com anseios, sonhos, relações e sentimentos. Um estudante feliz, e que conhece a si mesmo, saberá contar com a ajuda do professor para planejar a sua vida, agora ou futura.

Trazer para a rotina da escola esse tipo de abordagem, a princípio, pode gerar alguma insegurança ou intranquilidade. Mas é só no começo. Com o tempo, as ações vão tomando o rumo adequado para a sua realidade. É preciso ter flexibilidade e, muitas vezes, deixar o estudante escolher, inclusive, o que ele quer estudar, analisando a utilidade daquilo para o seu projeto de vida. Para muitos educadores, às vezes, é difícil abrir mão de conteúdos que consideram importantes e que sempre ensinaram.

Você pode refletir sobre o tempo gasto dentro da escola, já que investir no projeto de vida dos alunos, certamente, vai alterar seu planejamento escolar. Fique atento à grade horária e procure agendar esse tempo com outros professores, de modo que consigam otimizá-lo e, juntos, atender um número maior de estudantes. Para isso, você pode pensar em duas opções: definir um momento em cada semana ou momentos em matérias diferentes para o aluno refletir de que forma o conteúdo estudado impacta o seu projeto de vida.

Nesse horário, focávamos nos sonhos que eles traziam e trabalhávamos juntos que caminhos eles poderiam percorrer para realizá-los, desde que disciplinas eles deveriam focar até mesmo que escola de ensino médio seria mais interessante para eles, depois de saírem do GEC.

Ideia! Tente separar um momento para conversar com os estudantes sobre suas vidas, dentro e fora da escola. De forma bem descontraída, procure identificar os principais sonhos e dificuldades de cada um. Crie um diário em que você registre tudo isso, principalmente os pontos de atenção, para que possa pedir ajuda a outros professores ou profissionais, quando necessário. É importante o estudante sentir que você está lá para ajudá-lo!

Muitas situações eram resolvidas no momento de projeto de vida e os resultados eram sentidos durante as aulas. Os estudantes criavam elos muito importantes entre eles, se ajudando e progredindo juntos. O formato do momento foi mudando com o tempo. Hoje, por exemplo, sei que eles utilizam diários. Trabalhar o projeto de vida não tem receita. Cada grupo vai criando a sua forma de construir esse momento.

Uma alternativa é sair da sala de aula para colocar os projetos em prática, sempre que possível. Leve os estudantes para outro ambiente, mais neutro e acolhedor, onde não estejam sentados em carteiras. Isso ajuda a desvincular aquele momento de uma aula comum, deixando os alunos mais descontraídos e abertos ao diálogo.

Quando você mexe com o emocional do estudante, você começa a descobrir muitas coisas diferentes do que você tinha naquela sala, onde estava todo mundo sentadinho, um atrás do outro, né?

O projeto de vida de um indivíduo pode mudar de várias formas, diante de novos desafios e oportunidades. Ou seja, precisamos compreender que até o próprio estudante pode mudar o seu projeto de vida, o que não é nenhum problema. Por isso, é importante garantir que ele tenha acesso a uma gama de conhecimentos diversificados para, quem sabe, acabar descobrindo outras afinidades até então ocultas.

Não há um formato fechado para se trabalhar com projetos de vida. Na Índia, um projeto conhecido como “Vovós nas Nuvens” conta com a ajuda de idosas que trabalham como mediadoras, conversando remotamente com os estudantes sobre temas relevantes para eles, dando inclusive conselhos, além de ler histórias ou contar um pouco sobre seu país de origem, que tem uma realidade tão diferente da Índia, a Grã-Bretanha. O momento ultrapassa os limites da sua localidade e vai muito além, por meio da internet, já que os envolvidos estão a muitos quilômetros de distância uns dos outros.

Não podemos ignorar que a localidade da escola, muitas vezes, pode ter grande influência nos anseios e referências desses estudantes. Em alguns casos, percebemos que o fator familiar tem peso considerável nessas escolhas, e não há nada de errado nisso.

O importante é que, independentemente de sua aptidão, cada estudante possa acessar oportunidades variadas, que se desdobrem a partir desses interesses, conhecendo também outras áreas de atuação.

Muitos projetos (aprendizagem baseada em projetos) saem na linha da agricultura, a questão de criação dos animais e outros assuntos relacionados ao campo, muito próximos à realidade das famílias deles. Não são todos os estudantes que se interessam por essas questões, mas são muitos.

Ideia! Se você trabalha numa escola de contexto rural, procure identificar quais são as referências que os estudantes possuem sobre o trabalho no campo e mostre o leque de caminhos que podem ser percorridos, a partir do interesse de cada um. Organize oficinas temáticas, convide os familiares e incentive a troca de conhecimentos. Pode ser bastante inspirador!

O projeto de vida não acontece só na escola. Por isso, é importante envolver, de alguma forma, a família dos estudantes. Provavelmente, alguns pais ou responsáveis sequer conversem com os jovens a respeito. Então, é preciso estimular o diálogo.

Ao final de cada momento, pense em alguma atividade extraclasse que incentive essa aproximação. Uma boa ideia para saber como está avançando o apoio dos pais é criar um diário, em que o jovem relate suas impressões sobre como a família reage aos seus anseios.

Tem um grupo de pais voluntários que trabalham para preparar os estudantes para fazer o exame da escola técnica. O que eu vejo é que as crianças começam a pensar em seus projetos de vida. O que elas querem da vida, o que elas querem estudar, o que elas não querem. As crianças saem com vontade de aprender quando sentem prazer nisso. Temos um grupo de estudantes que adora as aulas de grego e latim, por exemplo.

Exemplos de quem já faz
  • O foco do Student Bank Project, da Tailândia, é o ensino teórico e prático sobre finanças e economia. Os alunos possuem cargos administrativos como gerente financeiro ou contador, iguais aos de um banco convencional. O principal objetivo é que eles tenham consciência financeira e capacidade de gerir seus recursos para toda vida. Os pais dos alunos são convidados a ser clientes dos bancos, especialmente os que pertencem a famílias indígenas ou que são expatriados, com dificuldade de abrir contas em bancos tradicionais. O banco da escola Wat Kod Tin Taram, no leste do país, obteve US$ 50 mil em poupança, por um período de dois anos, com o suporte dado pelo projeto.

  • Imagem de Alunos

Ideia! Você pode pedir ao jovem que faça um gráfico, por exemplo, com seus principais objetivos e como os pais ou responsáveis podem ajudá-lo a seguir pelos diversos caminhos. É importante que nele estejam os maiores facilitadores e também as principais barreiras. O gráfico pode ser melhorado e ampliado a cada mês, de modo que você ajude o estudante a colocar em prática o seu projeto de vida.

Passo a passo

Faça uma reflexão sobre a vida dos estudantes. Entenda o contexto em que eles se encontram e promova conversas com outros professores sobre essa preocupação para que, juntos, possam identificar os interesses dos alunos.

Organize uma roda de conversa com os alunos, colocando as seguintes questões:

Para disseminar o progresso desse trabalho, converse com os estudantes e discuta qual a melhor forma de compartilhar o que foi discutido: seja em um blog, em um grupo no WhatsApp, numa página no Facebook ou até mesmo em um evento, com a participação da família, da comunidade e de outras escolas, que podem seguir o exemplo, fazendo o mesmo.

Periodicamente, realize novas rodadas de discussões, refinando os interesses apresentados pelos alunos com questões mais complexas:

Reflita sobre o tempo que é dedicado para as atividades extraclasse, em que a interação entre professor e aluno não seja sobre uma matéria específica. Incentive os demais professores a fazerem o mesmo.

Tente sair da sala de aula para colocar esse projeto em prática, sempre que possível. É interessante levar os estudantes para outro ambiente, mais neutro e acolhedor, onde não estejam sentados em carteiras.

Os estudantes podem escolher trabalhar em temas que fujam bastante do currículo tradicional. Nesse caso, é preciso administrar quanto tempo essa atividade deve tomar. A não ser que a produtividade das aulas aumente, alguns conteúdos terão que ser trabalhados de outra forma. Então, fique sempre atento e lembre-se de que o diálogo com os demais atores da escola é essencial em todo o processo.

Nunca se esqueça de estimular a interação entre a escola e a família dos estudantes. Se todos estiverem alinhados, maior será a chance de desenvolver um projeto de vida para esses jovens.

Contribua para o delineamento das disciplinas eletivas a serem oferecidas pela escola, de forma que respondam aos interesses dos alunos.